185 Nota de Allan Kardec: Todas as doutrinas filosóficas e religiosas trazem o nome do seu fundador. Diz-se: o Moisaísmo, o Cristianismo, o Maometismo, o Budismo, o Cartesianismo, o Furrierismo, o Sansimonismo etc. A palavra Espiritismo, ao contrário, não lembra nenhuma personalidade; encerra uma ideia geral, que ao mesmo tempo indica o caráter e o tronco multíplice da Doutrina.
Anunciação do Consolador
35. “se me amais, guardai os meus mandamentos — e eu pedirei a meu pai e ele vos enviará outro consolador, a fim de que fique eternamente convosco: — O Espírito de Verdade que o mundo não pode receber, porque não o vê; vós, porém,
o conhecereis, porque permanecerá convosco e estará em vós. — mas o consolador, que é o espírito santo, que meu pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e fará vos lembreis de tudo o que vos tenho dito.” (João, 14:15 a 17 e 26; O evangelho segundo o espiritismo, cap. vi.) 36. “entretanto, digo-vos a verdade: convém que eu me vá, porquanto, se eu não me for, o consolador não vos virá; eu, porém, me vou e vo-lo enviarei. — e, quando ele vier, convencerá o mundo no que respeita ao pecado, à justiça e ao juízo; — no que respeita ao pecado, por não terem acreditado em mim; — no que respeita à justiça, porque me vou para meu pai e não mais me vereis; no que respeita ao juízo, porque já está julgado o príncipe deste mundo. tenho ainda muitas coisas a dizer-vos, mas presentemente não as podeis suportar. Quando vier esse espírito de verdade, ele vos ensinará toda a verdade, porquanto não falará de si mesmo, mas dirá tudo o que tenha escutado e vos anunciará as coisas porvindouras. Ele me glorificará, porque receberá do que está em mim e vo-lo anunciará.” (João, 16:7 a 14.) 37. esta predição, não há contestar, é uma das mais importantes, do ponto de vista religioso, porquanto comprova, sem a possibilidade do menor equívoco, que Jesus não disse tudo o que tinha a dizer, pela razão de que não o teriam compreendido nem mesmo seus apóstolos, visto que a eles é que o mestre se dirigia. se lhes houvesse dado instruções secretas, os evangelhos fariam referência a tais instruções. ora, desde que ele não disse tudo a seus apóstolos, os sucessores destes não terão podido saber mais do que eles, com relação ao que foi dito; ter-se-ão possivelmente enganado, quanto ao sentido das palavras do senhor, ou dado interpretação falsa aos seus pensamentos, muitas vezes velados sob a forma parabólica. As religiões que se fundaram no evangelho não podem, pois, dizer-se possuidoras de toda a verdade, porquanto ele, Jesus, reservou para si a completação ulterior de seus ensinamentos. o princípio da imutabilidade, em que elas se firmam, constitui um desmentido às próprias palavras do cristo. sob o nome de Consolador e de Espírito de Verdade, Jesus anunciou a vinda daquele que havia de ensinar todas as coisas e de lembrar o que ele dissera. logo, não estava completo o seu ensino. e, ao demais, prevê não só que ficaria esquecido, como também que seria desvirtuado o que por ele fora dito, visto que o espírito de verdade viria tudo lembrar e, de combinação com elias, restabelecer todas as coisas, isto é, pô-las de acordo com o verdadeiro pensamento de seus ensinos. 38. Quando terá de vir esse novo revelador? é evidente que se, na época em que Jesus falava, os homens não se achavam em estado de compreender as coisas que lhe restavam a dizer, não seria em alguns anos apenas que poderiam adquirir as luzes necessárias a entendê-las. para a inteligência de certas partes do evangelho, excluídos os preceitos morais, faziam-se mister conhecimentos que só o progresso das ciências facultaria e que tinham de ser obra do tempo e de muitas gerações. se, portanto, o novo messias tivesse vindo pouco tempo depois do cristo, houvera encontrado o terreno ainda nas mesmas condições e não teria feito mais do que o mesmo cristo. ora, desde aquela época até os nossos dias, nenhuma grande revelação se produziu que haja completado o evangelho e elucidado suas partes obscuras, indício seguro de que o enviado ainda não aparecera. 39. Qual deverá ser esse enviado? dizendo: “pedirei a meu pai e ele vos enviará outro consolador”, Jesus claramente indica que esse consolador não seria ele, pois, do contrário, dissera: “voltarei a completar o que vos tenho ensinado.” não só tal não disse, como acrescentou: “A fim de que fique eternamente convosco e ele estará em vós.” esta proposição não poderia referir-se a uma individualidade encarnada, visto que não poderia ficar eternamente conosco, nem, ainda menos, estar em nós; compreendemo-la, porém, muito bem com referência a uma doutrina, a qual, com efeito, quando a tenhamos assimilado, poderá estar eternamente em nós. o Consolador é, pois, segundo o pensamento de Jesus, a personificação de uma doutrina soberanamente consoladora, cujo inspirador há de ser o Espírito de Verdade. 40. o Espiritismo realiza, como ficou demonstrado (cap. i, item 30), todas as condições do Consolador que Jesus prometeu. não é uma doutrina individual, nem de concepção humana; ninguém pode dizer-se seu criador. é fruto do ensino coletivo dos espíritos, ensino a que preside o espírito de verdade. nada suprime do evangelho: antes o completa e elucida. com o auxílio das novas leis que revela, conjugadas essas leis às que a ciência já descobrira, faz se compreenda o que era ininteligível e se admita a possibilidade daquilo que a incredulidade considerava inadmissível. teve precursores e profetas, que lhe pressentiram a vinda. pela sua força moralizadora, ele prepara o reinado do bem na terra. A doutrina de moisés, incompleta, ficou circunscrita ao povo judeu; a de Jesus, mais completa, se espalhou por toda a terra, mediante o cristianismo, mas não converteu a todos; o espiritismo, ainda mais completo, com raízes em todas as crenças, converterá a humanidade.185 41. dizendo a seus apóstolos: “outro virá mais tarde, que vos ensinará o que agora não posso ensinar”, proclamava Jesus a necessidade da reencarnação. como poderiam aqueles homens aproveitar do ensino mais completo que ulteriormente seria ministrado; como estariam aptos a compreendê-lo, se não tivessem de viver novamente? Jesus houvera proferido uma coisa inconsequente se, de acordo com a doutrina vulgar, os homens futuros houvessem de ser homens novos, almas saídas do nada por ocasião do nascimento. Admita-se, ao contrário, que os apóstolos e os homens do tempo deles tenham vivido depois; que ainda hoje revivem, e plenamente justificada estará a promessa de Jesus. tendo-se desenvolvido ao contato do progresso social, a inteligência deles pode presentemente comportar o que então não podia. sem a reencarnação a promessa de Jesus fora ilusória. 42. se disserem que essa promessa se cumpriu no dia de pentecostes, por meio da descida do espírito santo, poder-se-á responder que o espírito santo os inspirou, que lhes desanuviou a inteligência, que desenvolveu neles as aptidões mediúnicas destinadas a facilitar-lhes a missão, porém que nada lhes ensinou além daquilo que Jesus já ensinara, porquanto, no que deixaram, nenhum vestígio se encontra de um ensinamento especial. o espírito santo, pois, não realizou o que Jesus anunciara relativamente ao consolador; a não ser assim, os apóstolos teriam elucidado o que, no evangelho, permaneceu obscuro até o dia de hoje e cuja interpretação contraditória deu origem às inúmeras seitas que dividiram o cristianismo desde os primeiros séculos.
Génese
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