São chegados os tempos

•  Sinais dos tempos • A geração nova
Sinais dos tempos


1.  são chegados os tempos, dizem-nos de todas as partes, marcados por  deus, em que grandes acontecimentos se vão dar para regeneração da humanidade.  em que  sentido se  devem entender essas palavras proféticas?  para os incrédulos, nenhuma importância têm; aos seus olhos, nada mais exprimem que uma crença pueril, sem fundamento. para a maioria dos crentes, elas apresentam qualquer coisa de místico e de sobrenatural, parecendo-lhes prenunciadoras da subversão das leis da  natureza.  são  igualmente  errôneas  ambas  essas interpretações:  a  primeira, porque envolve uma negação da  providência; a segunda, porque tais palavras não anunciam a perturbação das leis da natureza, mas o cumprimento dessas leis. 2.  tudo na  criação é harmonia; tudo revela uma previdência que não se desmente, nem nas menores, nem nas maiores coisas.  temos, pois, que afastar, desde logo, toda ideia de capricho, por inconciliável com a sabedoria divina.  em segundo lugar, se a nossa época está designada para a realização de certas coisas, é que estas têm uma razão de ser na marcha do conjunto. isto posto, diremos que o nosso globo, como tudo o que existe, esta submetido à lei do progresso.  ele progride, fisicamente, pela transformação dos elementos que o compõem e, moralmente, pela depuração dos  espíritos encarnados e desencarnados que o povoam. Ambos esses progressos se realizam paralelamente, porquanto o melhoramento da habitação guarda relação com o do habitante.  fisicamente, o globo terráqueo  há  experimentado  transformações  que  a  ciência  tem  comprovado e que o tornaram sucessivamente habitável por seres cada vez mais aperfeiçoados.  moralmente, a humanidade progride pelo desenvolvimento da inteligência, do senso moral e do abrandamento dos costumes. Ao mesmo tempo que o melhoramento do globo se opera sob a ação das forças materiais, os homens para isso concorrem pelos esforços de sua inteligência.  saneiam as regiões insalubres, tornam mais fáceis as comunicações e mais produtiva a terra. de duas maneiras se executa esse duplo progresso: uma, lenta, gradual e insensível; a outra, caracterizada por mudanças bruscas, a cada uma das quais corresponde um movimento ascensional mais rápido, que assinala, mediante impressões bem acentuadas, os períodos progressivos da humanidade.  esses movimentos, subordinados,  quanto às particularidades, ao livre-arbítrio dos homens, são, de certo modo, fatais em seu conjunto, porque estão sujeitos a leis, como os que se verificam na germinação, no crescimento e na maturidade das plantas.  por isso é que o movimento progressivo se efetua, às vezes, de modo parcial, isto é, limitado a uma raça ou a uma nação, doutras vezes, de modo geral. o progresso da humanidade se cumpre, pois, em virtude de uma lei.  ora, como todas as leis da natureza são obra eterna da sabedoria e da presciência divinas, tudo o que é efeito dessas leis resulta da vontade de deus, não de uma vontade acidental e caprichosa, mas de uma vontade imutável.  Quando, por  conseguinte, a  humanidade está  madura  para subir um degrau, pode dizer-se que são chegados os tempos marcados por deus, como se pode dizer também que, em tal estação, eles chegam para a maturação dos frutos e sua colheita. 3.  do fato de ser inevitável, porque é da natureza o movimento progressivo da humanidade, não se segue que  deus lhe seja indiferente e que,  depois de  ter  estabelecido leis,  se haja  recolhido  à inação, deixando que as coisas caminhem por si sós.  sem dúvida, suas leis são eternas e imutáveis, mas  porque a sua  própria vontade é  eterna e constante e  porque o seu pensamento anima sem interrupção todas as coisas.  esse pensamento, que em tudo penetra, é a força inteligente e permanente que mantém a harmonia em tudo.  cessasse ele um só instante de atuar e o universo seria como um relógio sem pêndulo regulador.  deus, pois, vela incessantemente  pela    execução  de  suas  leis  e  os  espíritos  que    povoam o espaço são  seus ministros,  encarregados de  atender  aos pormenores, dentro de atribuições que correspondem ao grau de adiantamento que tenham alcançado. 4.  o  universo é, ao mesmo tempo, um mecanismo incomensurável, acionado por um número incontável de inteligências, e um imenso governo em o qual cada ser inteligente tem a sua parte de ação sob as vistas do soberano  senhor, cuja vontade  única  mantém por toda parte a unidade.  sob o império dessa vasta potência reguladora, tudo se move, tudo funciona em perfeita ordem.  onde nos parece haver perturbações, o que há são movimentos parciais e isolados, que se nos afiguram irregulares apenas porque circunscrita é a nossa visão.  se lhes pudéssemos abarcar o conjunto, veríamos que tais irregularidades são apenas aparentes e que se harmonizam com o todo. 5.  A humanidade tem realizado, até o presente, incontestáveis progressos.  os homens, com a sua inteligência, chegaram a resultados que jamais haviam alcançado, sob o ponto de vista das ciências, das artes e do bem-estar material.  resta-lhes ainda um imenso progresso a realizar: o de fazerem que entre si reinem a caridade, a fraternidade, a solidariedade, que lhes assegurem o bem-estar moral.  não poderiam consegui-lo nem com as suas crenças, nem com as suas instituições antiquadas, restos de outra idade, boas para certa época, suficientes para um estado transitório, mas que, havendo dado tudo o que comportavam, seriam hoje um entrave. Já não é  somente de desenvolver a inteligência  o de que  os homens necessitam, mas de elevar o sentimento e, para isso, faz-se preciso destruir tudo o que superexcite neles o egoísmo e o orgulho. tal o período em que doravante vão entrar e que marcará uma das fases principais da vida da humanidade.  essa fase, que neste momento se elabora, é o complemento indispensável do estado precedente, como a idade viril o é da juventude.  ela podia, pois, ser prevista e predita de antemão e é por isso que se diz que são chegados os tempos determinados por  deus. 6.  nestes tempos, porém, não se trata de uma mudança parcial, de uma renovação limitada a certa região, ou a um povo, a uma raça.
trata-se de um movimento universal, a operar-se no sentido do  progresso moral.  uma nova ordem de coisas tende a estabelecer-se, e os homens, que mais opostos lhe são, para ela trabalham a seu mau grado. A geração futura, desembaraçada das escórias do velho mundo e formada de elementos mais depurados, se achará possuída de ideias e de sentimentos muito diversos dos da geração presente, que se vai a passo de gigante.  o velho mundo estará morto e apenas viverá na História, como o estão hoje os tempos da  idade  média, com seus costumes bárbaros e suas crenças supersticiosas. Aliás, todos sabem quanto ainda deixa a desejar a atual ordem de coisas.  depois de se haver, de certo modo, considerado todo o bem-estar material, produto da inteligência, logra-se compreender que o complemento desse bem-estar somente pode achar-se no desenvolvimento moral.  Quanto mais se  avança,  tanto mais  se  sente  o  que falta,  sem  que, entretanto, se possa ainda definir claramente o que seja: é isso efeito do trabalho íntimo que  se opera em prol da  regeneração.  surgem desejos, aspirações, que são como que o pressentimento de um estado melhor. 7.  mas uma mudança tão radical como a que se está elaborando não pode realizar-se sem comoções. Há, inevitavelmente, luta de ideias. desse conflito forçosamente se originarão passageiras perturbações, até que o terreno se ache aplanado e restabelecido o equilíbrio.  é, pois, da luta das ideias que surgirão os graves acontecimentos preditos e não de cataclismos ou catástrofes puramente materiais.  os cataclismos gerais foram  consequência  do  estado  de  formação  da  terra.  Hoje,  não  são  mais  as entranhas do planeta que se agitam: são as da humanidade. 8.  se a  terra já não tem que temer os cataclismos gerais, nem por isso  deixa de  estar  sujeita a  periódicas  revoluções, cujas  causas, do ponto de vista científico, se encontram explicadas nas instruções seguintes, promanantes de dois  espíritos eminentes:187 “cada  corpo  celeste,  além  das  leis  simples  que  presidem  à  divisão dos dias e das noites, das estações etc., experimenta revoluções que demandam milhares de séculos para sua realização completa, porém que, como as revoluções mais breves, passam por todos os períodos, desde o de nascimento até o de um máximo de efeito, após o qual há decrescimento, até o limite extremo, para recomeçar em seguida o percurso das mesmas fases. “o homem apenas apreende as fases de duração relativamente curta  e  cuja  periodicidade  ele pode comprovar.  Algumas, no entanto,  há que abrangem longas gerações de seres e, até, sucessões de raças, revoluções essas cujos efeitos, conseguintemente, se lhe apresentam com caráter de novidade e de espontaneidade, ao passo que, se seu olhar pudesse projetar-se para trás alguns milhares de séculos, veria, entre aqueles mesmos efeitos e suas causas, uma correlação de que nem suspeita.  esses períodos que, pela sua extensão relativa, confundem a imaginação dos humanos, não são, contudo, mais do que instantes na duração eterna. “num mesmo sistema planetário, todos os corpos que o constituem reagem uns sobre os outros; todas as influências físicas são nele solidárias e nem um só há, dos efeitos que designais pelo nome de grandes perturbações, que não seja consequência da componente das influências de todo o sistema. “vou mais longe: digo que os sistemas planetários reagem uns sobre os outros, na razão da proximidade ou do afastamento resultantes do movimento de translação deles, através das miríades de sistemas que compõem  a nossa nebulosa.  Ainda  vou mais  longe:  digo que  a  nossa nebulosa, que é um como arquipélago na imensidade, tendo também seu movimento de translação através das miríades de nebulosas, sofre a influência das de que ela se aproxima. “de sorte que as nebulosas reagem sobre as nebulosas, os sistemas reagem sobre os sistemas, como os planetas reagem sobre os planetas, como os elementos de cada planeta reagem uns sobre os outros e assim sucessivamente até o átomo.  daí, em cada mundo, revoluções locais ou gerais, que sê  não parecem  perturbações  porque a brevidade  da  vida não permite se lhes percebam mais do que os efeitos parciais. “A matéria orgânica não poderia escapar a essas influências; as perturbações que ela sofre podem, pois, alterar o estado físico dos seres vivos e determinar algumas dessas enfermidades que atacam de modo geral as plantas, os animais e os homens, enfermidades que, como todos os f lagelos, são, para a  inteligência humana, um estimulante  que a impele, por força da necessidade, a procurar meios de os combater e a descobrir leis da natureza. “mas a matéria orgânica, a seu turno, reage sobre o  espírito.  este, pelo seu contato e sua ligação íntima com os elementos materiais, também sofre influências que lhe modificam as disposições, sem, no entanto, privá-lo do livre-arbítrio, que lhe sobre-excitam ou atenuam a atividade e que, pois, contribuem para o seu desenvolvimento. A efervescência que por    vezes se manifesta em toda uma população, entre os homens de uma mesma raça, não é coisa fortuita, nem resultado de um capricho; tem sua causa nas leis da natureza.  essa efervescência, inconsciente a princípio, não passando de vago desejo, de aspiração indefinida por alguma coisa melhor, de certa necessidade de mudança, traduz-se por uma surda agitação, depois por atos que levam às revoluções sociais, que, acreditai-o, também têm sua periodicidade, como as revoluções físicas, pois que tudo se  encadeia.  se  não  tivésseis  a  visão  espiritual  limitada  pelo  véu  da  matéria, veríeis as correntes fluídicas que, como milhares de fios condutores, ligam as coisas do mundo espiritual às do mundo material. “Quando se vos diz que a humanidade chegou a um período de transformação e que a  terra tem que se elevar na hierarquia dos mundos, nada de místico vejais nessas palavras; vede, ao contrário, a execução da uma  das  grandes  leis  fatais  do  universo,  contra  as  quais  se  quebra  toda  a má vontade humana.”188 Arago 9.  sim, decerto, a humanidade se transforma, como já se transformou noutras épocas, e cada transformação se assinala por uma crise que é, para o gênero humano, o que são, para os indivíduos, as crises de crescimento. Aquelas se tornam, muitas vezes, penosas, dolorosas, e arrebatam consigo as gerações e as instituições, mas, são sempre seguidas de uma fase de progresso material e moral. A humanidade terrestre, tendo chegado a um desses períodos de crescimento, está em cheio, há quase um século, no trabalho da sua transformação, pelo que a vemos agitar-se de todos os lados, presa de uma espécie de febre e como que impelida por invisível força. Assim continuará, até que  se haja outra  vez estabilizado em  novas bases. Quem a  observar, então,  achá-la-á  muito  mudada  em  seus  costumes,  em  seu  caráter,  nas suas leis, em suas crenças, numa palavra: em todo o seu estado social. “uma  coisa que vos  parecerá estranhável,  mas que  por isso não deixa de ser rigorosa verdade, é que o mundo dos  espíritos, mundo que vos  rodeia,  experimenta  o  contrachoque  de  todas  as  comoções  que  abalam o mundo dos encarnados.  digo mesmo que aquele toma parte ativa nessas comoções.  nada tem isto de surpreendente, para quem sabe que os  espíritos fazem corpo com a humanidade; que eles saem dela e a ela têm de voltar, sendo, pois, natural se interessem pelos movimentos que se operam entre os homens.  ficai, portanto, certos de que, quando uma revolução social se produz na  terra, abala igualmente o mundo invisível, onde todas as paixões, boas e más, se exacerbam, como entre vós.  indizível efervescência entra a reinar na coletividade dos  espíritos que ainda pertencem ao vosso mundo e que aguardam o momento de a ele volver. “À agitação dos encarnados e desencarnados se juntam às vezes, e frequentemente  mesmo, já  que tudo se  conjuga em  a natureza,  as  perturbações dos elementos físicos.  dá-se então, durante algum tempo, verdadeira  confusão  geral, mas  que  passa  como  furacão, após  o  qual  o céu  volta a estar sereno, e a humanidade, reconstituída sobre novas bases, imbuída de novas ideias, começa a percorrer nova etapa de progresso. “é  no período que ora se inicia que o  espiritismo florescerá e dará frutos.  trabalhais,  portanto, mais para  o  futuro, do que  para o  presente. era, porém, necessário que esses trabalhos se preparassem antecipadamente, porque eles traçam as sendas da regeneração, pela unificação e racionalidade das crenças.  ditosos os que deles aproveitam desde já.  tantas penas se pouparão esses, quantos forem os proveitos que deles aufiram.” Doutor Barry 10.  do que precede resulta que, em consequência do movimento de translação que executam no espaço, os corpos celestes exercem, uns sobre os outros, maior ou menor influência, conforme a proximidade em que se achem entre si e as suas respectivas posições; que essa influência pode acarretar uma perturbação momentânea aos seus elementos constitutivos e modificar as condições de vitalidade dos seus habitantes; que a regularidade dos movimentos determina a volta periódica das mesmas causas e dos mesmos efeitos; que, se demasiado curta é a duração de certos períodos para que os homens os apreciem, outros veem passar gerações e raças que deles não se apercebem e às quais se afigura normal o estado de coisas que observam. Ao contrário, as gerações contemporâneas da transição lhe sofrem o contrachoque e tudo lhes parece fora das leis ordinárias.  essas gerações veem uma causa sobrenatural, maravilhosa, miraculosa no que, em realidade, mais não é do que a execução das leis da natureza. se, pelo encadeamento e a solidariedade das causas e dos efeitos, os períodos de renovação moral da humanidade coincidem, como tudo leva a crer, com as revoluções físicas do globo, podem os referidos períodos ser acompanhados ou precedidos de fenômenos naturais, insólitos para os que com eles não se acham familiarizados, de meteoros que parecem estranhos, de recrudescência e intensificação desusadas dos flagelos destruidores, que não são nem causa, nem presságios sobrenaturais, mas uma consequência do movimento geral que se opera no mundo físico e no mundo moral. Anunciando a época de renovação que se havia de abrir para a humanidade e determinar o fim do velho mundo, a Jesus, pois, foi lícito dizer  que ela  se assinalaria  por  fenômenos extraordinários, tremores  de terra, flagelos diversos, sinais no céu, que mais não são do que meteoros, sem ab-rogação das leis naturais.  o  vulgo, porém, ignorante, viu nessas palavras a predição de fatos miraculosos.189 11.  A previsão dos movimentos progressivos da humanidade nada apresenta de surpreendente, quando feita por seres desmaterializados, que veem o fim a que tendem todas as coisas, tendo alguns deles conhecimento direto do pensamento de  deus.  pelos movimentos parciais, esses seres veem em que época poderá operar-se um movimento geral, do mesmo modo que o homem pode calcular de antemão o tempo que uma árvore levará para dar frutos, do mesmo modo que os astrônomos calculam a época de um fenômeno astronômico, pelo tempo que um astro gasta para efetuar a sua revolução.

189   Nota  de  Allan  Kardec: A  terrível epidemia que,  de  1866  a 1868, dizimou  a população  da Ilha Maurício, teve a precedê-la tão extraordinária e tão abundante chuva de estrelas cadentes, em novembro de 1866, que aterrorizou os habitantes daquela ilha. A partir desse momento, a doença, que reinava desde alguns meses de forma muito benigna, se transformou em verdadeiro flagelo devastador. Aquele fora bem um sinal no céu e talvez nesse sentido é que se deva entender a frase — estrelas caindo do céu, de que  fala o Evangelho, como um  dos sinais dos tempos. (Pormenores sobre a epidemia da Ilha Maurício:  Revista espírita, julho de 1867, e novembro de 1868.)

não  mais  se deixa  levar por ilusões,  nem fantasmagorias;  sua  razão  amadurecida reclama alimentos mais substanciosos.  é  demasiado efêmero o presente; ela sente que mais amplo é o seu destino e que a vida corpórea é excessivamente restrita para encerrá-lo inteiramente.  por isso, mergulha o olhar no passado e no futuro, a fim de descobrir num ou noutro o mistério da sua existência e de adquirir uma consoladora certeza. e  é no momento em que ela se encontra muito apertada na esfera material, em que transbordante se encontra de vida intelectual, em que o sentimento da espiritualidade lhe desabrocha no seio, que homens que se dizem filósofos pretendem encher o vazio com as doutrinas do niilismo e do materialismo!  singular aberração!  esses mesmos homens, que intentam impelir para a frente a humanidade, se esforçam por circunscrevê-la no  acanhado  círculo  da  matéria,  donde  ela  anseia  por  escapar-se.  velam--lhe o aspecto da vida infinita e lhe dizem, apontando para o túmulo: Nec plus ultra!191 15.  Quem quer que haja meditado sobre o  espiritismo e suas consequências e não o circunscreva à produção de alguns fenômenos terá compreendido que ele abre à humanidade uma estrada nova e lhe desvenda os horizontes do infinito.  iniciando-a nos mistérios do mundo invisível, mostra-lhe o seu verdadeiro papel na criação, papel  perpetuamente ativo, tanto no estado espiritual, como no estado corporal.  o  homem já não caminha às cegas: sabe donde vem, para onde vai e por que está na terra.  o  futuro se lhe revela em sua realidade, despojado dos prejuízos da ignorância e da superstição. Já não se trata de uma vaga esperança, mas de  uma  verdade  palpável,  tão  certa  como  a  sucessão  do  dia  e  da  noite. ele sabe que o seu ser não se acha limitado a alguns instantes de uma existência transitória; que a vida espiritual não se interrompe por efeito da morte; que já viveu e tornará a viver e que nada se perde do que haja ganho em perfeição; em suas existências anteriores depara com a razão do que é hoje e reconhece que:  do que ele é hoje, qual se fez a si mesmo, poderá deduzir o que virá a ser um dia. 16.  com a ideia de que a atividade e a cooperação individuais na obra geral da civilização se limitam à vida presente, que, antes, a criatura nada foi e nada será depois, em que interessa ao homem o progresso ulterior da humanidade? Que lhe importa que no futuro os povos sejam 
191   N.E.: Nada mais além.

mais bem governados, mais ditosos, mais esclarecidos, melhores uns para com os outros?  não fica perdido para ele todo o progresso, pois que deste nenhum proveito tirará?  de que lhe serve trabalhar para os que hão de vir depois, se nunca lhe será dado conhecê-los, se os seus pósteros serão criaturas novas, que pouco depois voltarão por sua vez ao nada?  sob o domínio da negação do futuro individual, tudo forçosamente se amesquinha às insignificantes proporções do momento e da personalidade. entretanto, que amplitude, ao contrário, dá ao pensamento do homem a certeza da perpetuidade do seu ser espiritual! Que de mais racional, de mais grandioso, de mais digno do  criador do que a lei segundo a qual a vida espiritual e a vida corpórea são apenas dois modos de existência, que se alternam para a realização do progresso! Que de mais justo há e de mais consolador do que a ideia de estarem os mesmos seres a progredir incessantemente, primeiro, pelas gerações de um mesmo mundo, de mundo  em  mundo  depois,  até  a  perfeição,  sem  solução  de  continuidade! todas as ações têm, então, uma finalidade, porquanto, trabalhando para todos, cada um trabalha para si e reciprocamente, de sorte que nunca se podem considerar infecundos nem o progresso individual, nem o progresso coletivo.  de ambos esses progressos aproveitarão as gerações e as individualidades porvindouras, que outras não virão a ser senão as gerações e as individualidades passadas, em mais alto grau de adiantamento. 17.  A fraternidade será a pedra angular da nova ordem social; mas, não há fraternidade real, sólida, efetiva, senão assente em base inabalável e essa base é a fé, não a fé em tais ou tais dogmas particulares, que mudam com os tempos e os povos e que mutuamente se apedrejam, porquanto, anatematizando-se uns aos outros, alimentam o antagonismo, mas a fé nos princípios fundamentais que toda a gente pode aceitar e aceitará: Deus, a alma,  o futuro, o  progresso individual  indefinito, a  perpetuidade  das relações entre os seres. Quando todos os homens estiverem convencidos de que  deus é o mesmo para todos; de que esse  deus, soberanamente justo e bom, nada de injusto pode querer; que não dele, porém dos homens vem o mal, todos se considerarão filhos do mesmo  pai e se estenderão as mãos uns aos outros. essa a fé que o  espiritismo faculta e que doravante será o eixo em torno do qual girará o gênero humano, quaisquer que sejam os cultos e as crenças particulares.
18.  o progresso intelectual  realizado até  o  presente, nas  mais largas proporções, constitui um grande passo e marca uma primeira fase no avanço geral da humanidade; impotente, porém, ele é para regenerá-la. enquanto o orgulho e o egoísmo o dominarem, o homem se servirá da sua inteligência e dos seus conhecimentos para satisfazer às suas paixões e aos seus interesses pessoais, razão por que os aplica em aperfeiçoar os meios de prejudicar os seus semelhantes e de os destruir. 19.  somente o progresso moral pode assegurar aos homens a felicidade na  terra, refreando as paixões más; somente esse progresso pode fazer que entre os homens reinem a concórdia, a paz, a fraternidade. será ele que deitará por terra as barreiras que separam os povos, que fará caiam os preconceitos de casta e se calem os antagonismos de seitas, ensinando os homens a se considerarem irmãos que têm por dever auxiliarem-se mutuamente e não destinados a viver à custa uns dos outros. será  ainda  o  progresso  moral  que,  secundado  então  pelo  da  inteligência, confundirá os homens numa mesma crença fundada nas verdades eternas, não sujeitas a controvérsias e, em consequência, aceitáveis por todos. A unidade de crença será o laço mais forte, o fundamento mais sólido da fraternidade universal, obstada, desde todos os tempos pelos antagonismos religiosos que dividem os povos e as famílias, que fazem sejam uns, os dissidentes, vistos, pelos outros, como inimigos a serem evitados, combatidos, exterminados, em vez de irmãos a serem amados. 20.  semelhante estado de coisas pressupõe uma mudança radical no sentimento das massas, um progresso geral que não se podia realizar senão fora do círculo das ideias acanhadas e corriqueiras que fomentam o egoísmo.  em diversas épocas, homens de escol procuraram impelir a humanidade por esse caminho; mas, ainda muito jovem, ela se conservou surda e os ensinamentos que eles ministraram foram como a boa semente caída no pedregulho. Hoje, a humanidade está madura para lançar o olhar a alturas que nunca tentou divisar, a fim de nutrir-se de ideias mais amplas e compreender o que antes não compreendia. A  geração  que  desaparece  levará  consigo  seus  erros  e  prejuízos;  a geração que surge, retemperada em fonte mais pura, imbuída de ideias mais sãs, imprimirá ao mundo ascensional movimento, no sentido do progresso moral que assinalará a nova fase da evolução humana. 21.  essa fase já se revela por sinais inequívocos, por tentativas de reformas úteis e que começam a encontrar eco. Assim é que vemos fundar-se uma imensidade de instituições protetoras, civilizadoras e emancipadoras, sob o influxo e por iniciativa de homens evidentemente predestinados à obra da regeneração; que as leis penais se vão apresentando dia a dia impregnadas de sentimentos mais humanos.  enfraquecem--se os preconceitos de raça, os povos entram a considerar-se    membros de uma grande família; pela uniformidade e facilidade dos meios de realizarem suas transações, eles suprimem as barreiras que os separavam e de todos os pontos do mundo reúnem-se em comícios universais, para as justas pacíficas da inteligência. falta, porém, a essas reformas uma base que permita se desenvolvam, completem e  consolidem; falta  uma predisposição moral  mais generalizada, para fazer que elas frutifiquem e que as massas as acolham. Ainda aí há um sinal característico da época, porque há o prelúdio do que se efetuará em mais larga escala, à proporção que o terreno se for tornando mais favorável. 22.  outro sinal não menos característico do período em que entramos encontra-se na reação que se opera no sentido das ideias espiritualistas; na repulsão instintiva que se manifesta contra as ideias materialistas. o espírito de incredulidade, que se apoderara das massas, ignorantes ou esclarecidas, e as levava a rejeitar com a forma a substância mesma de toda crença, parece ter sido um sono, a cujo despertar se sente a necessidade de respirar um ar mais vivificante.  involuntariamente, lá onde o vácuo se fizera, procura-se alguma coisa, um ponto de apoio. 23.  se supusermos possuída desses sentimentos a maioria dos homens, poderemos facilmente imaginar as modificações que daí decorrerão para as relações sociais; todos terão por divisa: caridade, fraternidade, benevolência para com todos, tolerância para todas as crenças.  é  a meta para que tende evidentemente a humanidade; esse o objeto de suas aspirações, de seus desejos, sem que, entretanto, ela perceba claramente por que meio as há de realizar.  ensaia, tateia, mas é detida por muitas resistências ativas, ou pela  força de inércia dos preconceitos, das crenças estacionárias e refratárias ao progresso.  faz-se-lhe mister vencer tais resistências e essa será a obra da nova geração. Quem acompanhar o curso atual das coisas reconhecerá que tudo parece predestinado a lhe abrir caminho.  ela terá por si a dupla força do número e das ideias e, de acréscimo, a experiência do passado. 24.  A  nova  geração  marchará,  pois,  para  a  realização  de  todas  as ideias humanitárias compatíveis com o grau de adiantamento a que houver chegado. Avançando  para o mesmo alvo  e realizando seus objetivos, o  espiritismo  se  encontrará  com  ela  no  mesmo  terreno.  Aos  homens progressistas se deparará nas ideias espíritas poderosa alavanca e o  espiritismo achará, nos novos homens, espíritos inteiramente dispostos a acolhê-lo.  dado  esse  estado de  coisas,  que  poderão  fazer os  que  entendam de opor-se-lhe? 25.  o  espiritismo não cria a renovação social; a madureza da humanidade é que fará dessa renovação uma necessidade.  pelo seu poder moralizador, por suas tendências progressistas, pela amplitude de suas vistas,  pela  generalidade  das  questões  que  abrange,  o  espiritismo  é  mais apto, do que qualquer outra doutrina, a secundar o movimento de regeneração;  por  isso,  é  ele  contemporâneo  desse  movimento.  surgiu  na  hora em que podia ser de utilidade, visto que também para ele os tempos são chegados.  se viera mais cedo, teria esbarrado em obstáculos insuperáveis; houvera inevitavelmente sucumbido, porque, satisfeitos com o que tinham, os homens ainda não sentiriam falta do que ele lhes traz. Hoje, nascido com as ideias que fermentam, encontra preparado o terreno para recebê-lo.  os espíritos cansados da dúvida e da incerteza, horrorizados com o abismo que se lhes abre à frente, o acolhem como âncora de salvação e consolação suprema. 26.  grande, por certo, é ainda o número dos retardatários; mas, que podem eles contra a onda que se alteia, senão atirar-lhe algumas pedras?  essa onda é a geração que surge, ao passo que eles se somem com a geração que vai desaparecendo todos os dias a passos largos. Até lá, porém, eles defenderão palmo a palmo o terreno. Haverá, portanto, uma luta inevitável, mas luta desigual, porque é a do passado decrépito, a cair em frangalhos, contra o futuro juvenil.  será a luta da estagnação contra o progresso, da criatura contra a vontade do  criador, uma vez que chegados são os tempos por  ele determinados.


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