RELEMBRANDO A HISTÓRIA




No longínquo ano de 38, a figura de Pilatos ingressara em um período ainda mais turbulento já que sua conduta infeliz de pôr fim à própria vida o transferira para o mundo espiritual praticamente sem qualquer proteção ou preparo que lhe pudesse servir de ajuda no enfrentamento da nova situação. Preso na experiência do exílio, ainda que sem a presença de Zacarias, que houvera partido para a vida espiritual meses antes, vitimado pelo veneno que era destinado a ele próprio, Pilatos, poderia ali começar a resgatar através da dor alguns dos desmandos cometidos, amadurecendo o espírito e aprendendo a conquistar uma certa humildade diante da adversidade. Ali no cárcere da antiga guarnição onde houvera conquistado algumas de suas glórias mundanas, poderia melhor avaliar a transitoriedade das coisas, a maneira caprichosa com que a vida flui, num vai e vem, num efeito gangorra que ora coloca o homem no alto para, logo depois, conduzi-lo ao nível mais inferior que o de singelos escravos. Apesar das maneiras cruéis que o poder mundano tinha para punir as pessoas que não lhes serviam mais aos interesses, o castigo infligido ao antigo governador poderoso foi-lhe dado de acordo com as necessidades evolutivas para que propiciasse a sua renovação interior. A lei do Universo não estava preocupada em manter o homem apequenado na sua falsa condição de poderio e nobreza. Segundo as regras espirituais, a intenção primordial era e sempre será encaminhar a criatura para a verdade e para o amadurecimento real. Assim, a sua colocação em uma prisão naquele mesmo lugar de onde saíra como um respeitado comandante romano era o que poderia fazer-lhe mais benefícios do que qualquer outro destino que lhe fosse oferecido, já que a vergonha viria quebrar-lhe as fibras arrogantes, a humilhação propiciaria ao seu espírito a busca de novos caminhos para compreender a transitoriedade das glórias humanas.  Para isso, a bondade divina e a força do Amor verdadeiro haviam garantido para ele a constante companhia de Zacarias que, desde Jerusalém, se desdobrava para que Pilatos fosse ajudado e não estivesse solitário na longa jornada da queda que viria adiante. Além disso, Zacarias houvera conseguido o apoio de Lucílio que, ainda na sua falta, poderia seguir sendo um protetor a amparar-lhe as necessidades mais urgentes. Nada disso, entretanto, conseguira sensibilizar a alma enfraquecida daquele homem que houvera sido vencido pelas próprias armadilhas. A sua fragilidade moral ficara exposta em sua consciência e o carinho que recebia de Zacarias e do próprio Jesus, que não se havia descuidado dele desde antes de ter sido sua vítima, o transtornavam em face da vergonha que sentia vergonha essa que não tinha como superar. Na verdade, era uma grande mescla de sentimentos contraditórios que se estabelecia no íntimo de seu espírito. E a falta de Zacarias, o grande amigo e generoso conselheiro, o dçjxara perdido no meio da tormenta moral que vivia, sem coragem para seguir, sem conseguir ver o apoio que Lucílio poderia lhe conceder e sem forças para enfrentar-se na grande tragédia do Calvário da qual se sentia responsável por nada ter realizado. Desse modo, não lhe foi difícil escolher o caminho aparentemente mais fácil, menos desonroso para um soldado em desgraça, mas infinitamente mais doloroso para o espírito acovardado ante as decepções de uma vida adversa. E o suicídio foi o último ato de seu espírito débil, despreparado para as grandes decisões espirituais que envolveriam sempre a renúncia, a paciência, a compreensão de suas próprias fraquezas e culpas e o esforço paciencioso de recomeçar. A perturbação espiritual também lhe fizera a companhia necessária ao desequilíbrio pessoal.  

Isso porque Sulpício Tarquínius, seu braço direito durante longos anos de governo na província, seu comparsa nos delitos, seu ajudante de ordens imediato, acobertador de suas fraquezas, seu cúmplice nos desmandos e nos furtos havia sido transferido para o lado espiritual da vida anos antes, por ocasião da execução do velho Simeão, na Samaria, quando a grande e pesada cruz de madeira onde fizera amarrar o ancião que estava sendo chicoteado, depois de não mais suportar os embates do suplício, deslocou-se de sua base e caiu inesperadamente sobre o algoz atirando-o ao solo, o que lhe ocasionara a morte imediata. Desde então, o espírito atrasado e violento de Sulpício se mantinha jungido ao governador como a lhe servir ou a influir nas decisões odientas, mantendo a mesma ordem de cumplicidade negativa. Instigava-lhe a crueldade, produzia-lhe as sensações provocantes que lhe induziam a invigilância a buscar novas aventuras, no que se poderia considerar um perfeito casamento entre um espírito e um encarnado, na afinidade de gostos, desejos e inferioridades. No entanto, com o passar do tempo e a aproximação de Zacarias, Sulpício começou a perceber as modificações de Pilatos e a sua inclinação para um outro caminho, o que lhe causou um verdadeiro pavor, já que não se admitia desvinculado daquele que considerava o chefe a quem devia obedecer. Com isso e sem poder, efetivamente, impor-se diante das fortes vibrações de Zacarias, Sulpício começou a nutrir um forte desejo de forçar Pilatos a sair de tal influenciação e, de uma forma direta, teve participação na trama sombria que levou Zacarias a ingerir o veneno que Sávio havia posto na água que levara aocárcere de Pilatos. Espírito ignorante, acreditava que ajudando a afastar Zacarias da presença do governador, ficaria mais fácil de se conseguir recuperar a influência e o controle que detinha sobre ele. No entanto, depois que Zacarias morreu, tudo ficou muito pior, já que a perda do melhor e único amigo tornou Pilatos ainda mais ligado aos ensinamentos que o velhinho lhe havia deixado, fazendo-o pensar nas coisas de um modo diferente, sem aquela maldade característica dos velhos tempos.   A imagem de Jesus não era esquecida pelo preso e, muitas vezes, Pilatos havia sido flagrado por Sulpício realizando orações para esse profeta judeu, o que produzia no espírito uma imediata reação de revolta. Assim, acreditando que o governador estava sob o efeito de alguma alucinação, algum encantamento que lhe tirara a capacidade de pensar ou de agir, Sulpício deliberou que tudo deveria fazer para que Pilatos se transferisse para o mundo espiritual, a fim de que, deixando essa vida de dores e decepções, pudessem retomar o caminho dos desmandos, ainda que longe do corpo de carne. Além disso, Sulpício se deixara levar por um sentimento de raiva contra Lucílio e até mesmo, em algumas ocasiões, contra o próprio Pilatos, a quem achava que, se não estivesse vitimado por um novo encantamento, a sua transformação era um indício seguro de traição. E ele, o fiel lictor que dera sua vida para servir àquele homem déspota e poderoso, não deixaria as coisas seguirem por esse caminho, onde o governador resolvia mudar de lado, passar a ser bonzinho, trocar de deuses - o que era considerado uma heresia das mais graves na antiga crença dos romanos - sem que ele, Sulpício, interviesse. Fosse para tentar salvar o prisioneiro desse caminho torturante, fosse para punir suas novas condutas que eram consideradas fraquezas inaceitáveis, o certo é que Sulpício passou a influir ainda mais diretamente sobre o governador, insuflando-lhe pensamentos inferiores, apegando-se às suas fraquezas morais, fazendo com que ideias negativas lhe povoassem os sonhos, sem lhe permitir ao corpo o descanso indispensável. Mais do que isso, durante o repouso, inúmeras vezes, Pilatos se via perseguido por seres escuros, horripilantes, acusadores e desfigurados, que, na verdade, eram as suas antigas vítimas arrebanhadas pelo espírito de Sulpício, que as trazia das furnas escuras onde a revolta e o ódio às havia projetado para que o ajudassem a aumentar o cerco sobre aquele fracassado dirigente terreno O espírito do lictor, sabendo que Pilatos ferira muita gente com seu comportamento, na ideia de aumentar o peso negativo sobre a mente e o espírito deste, propiciara que muitos homens e mulheres que tinham se transferido para o mundo espiritual com ódio e desejo de vingança contra o governador conseguissem fazêlo agora que o mesmo estava derrotado e reduzido à condição de reles preso. Essa medida propiciou um agravamento do estado moral de Pilatos, pois, através das brechas de suas culpas e de seus pensamentos inferiores, uma grande quantidade de entidades se ligava à sua estrutura magnética e passava a sugar-lhe as forças vitais, produzindo um estado de fraqueza muito grande, alterando a sua consciência sobre as coisas, aproveitando-se dos complexos de culpa contra os quais Pilatos não lutara, tornandoos ainda piores. Com tudo isso, o preso ia se abatendo. Vozes interiores, ecos dos pensamentos e das palavras de suas antigas vítimas se aproveitavam de sua fragilidade e se impunham a ele com sugestões maliciosas, acusações sinistras, perseguições constantes que não lhe davam trégua. Além disso, conseguiam sempre influenciar algum dos soldados do campo vienense a se acercar da porta que guarnecia a prisão para escarnecer de seu estado, acusando-o de ter envergonhado a legião a que servira anteriormente, colocando-a em má situação diante do imperador. Eram velhos servidores que nutriam um orgulho de casta e que a simples presença de um governante militar em desgraça era um demérito para aquela agremiação. Pilatos tinha que escutar tudo isso e só contava com a palavra amiga de Lucílio, agora que Zacarias tinha morrido. As influências de todos os lados, somadas à fraqueza moral de seu caráter tíbio, fizeram com que ele visse na espada que lhe fora oferecida em certa ocasião, colocada ao seu alcance por um dos que escarneciam dele e desejava livrar-se dessa vergonha, o último recurso para sair desta vida. Assim, não titubeou quando, agarrado ao metal frio e rijo da espada romana, atirou-se contra a parede da cela, enterrando-a em seu ventre naquilo que considerava uma morte ao menos digna para um soldado. Nada conseguiu demover Pilatos dessa atitude. O espírito do lictor, sabendo que Pilatos ferira muita gente com seu comportamento, na ideia de aumentar o peso negativo sobre a mente e o espírito deste, propiciara que muitos homens e mulheres que tinham se transferido para o mundo espiritual com ódio e desejo de vingança contra o governador conseguissem fazêlo agora que o mesmo estava derrotado e reduzido à condição de reles preso. Essa medida propiciou um agravamento do estado moral de Pilatos, pois, através das brechas de suas culpas e de seus pensamentos inferiores, uma grande quantidade de entidades se ligava à sua estrutura magnética e passava a sugar-lhe as forças vitais, produzindo um estado de fraqueza muito grande, alterando a sua consciência sobre as coisas, aproveitando-se dos complexos de culpa contra os quais Pilatos não lutara, tornandoos ainda piores. Com tudo isso, o preso ia se abatendo. Vozes interiores, ecos dos pensamentos e das palavras de suas antigas vítimas se aproveitavam de sua fragilidade e se impunham a ele com sugestões maliciosas, acusações sinistras, perseguições constantes que não lhe davam trégua. Além disso, conseguiam sempre influenciar algum dos soldados do campo vienense a se acercar da porta que guarnecia a prisão para escarnecer de seu estado, acusando-o de ter envergonhado a legião a que servira anteriormente, colocando-a em má situação diante do imperador. Eram velhos servidores que nutriam um orgulho de casta e que a simples presença de um governante militar em desgraça era um demérito para aquela agremiação. Pilatos tinha que escutar tudo isso e só contava com a palavra amiga de Lucílio, agora que Zacarias tinha morrido. As influências de todos os lados, somadas à fraqueza moral de seu caráter tíbio, fizeram com que ele visse na espada que lhe fora oferecida em certa ocasião, colocada ao seu alcance por um dos que escarneciam dele e desejava livrar-se dessa vergonha, o último recurso para sair desta vida. Assim, não titubeou quando, agarrado ao metal frio e rijo da espada romana, atirou-se contra a parede da cela, enterrando-a em seu ventre naquilo que considerava uma morte ao menos digna para um soldado. Nada conseguiu demover Pilatos dessa atitude. Além disso tudo, em seu corpo espiritual Pilatos sentia doer profundamente o local do ventre que fora ferido pela perfuração da espada, como se ainda a tivesse enterrada na barriga, sangrando sem cessar e sem conseguir recursos para estancar o ferimento. No auge do desespero, Pilatos vislumbrou a figura de Sulpício que o observava sem intervir. Um lampejo de esperança tomou conta do olhar do insensato suicida, acreditando que Sulpício o ajudaria. Em vão pronunciou lhe o nome, como se o estivesse novamente convocando para uma tarefa como o fazia ao tempo de seu relacionamento na corte romana. Sulpício não se movia do lugar e o seu imobilismo ainda mais constrangia Pilatos. As lágrimas de desespero chegaram naturais aos seus olhos e, assim que começaram a ser vertidas, uma onda de estrondosas gargalhadas tomou conta de seus ouvidos e as acusações mesquinhas e irreverentes, irônicas e cruéis eram-lhe atiradas na face: - Desde quando uma serpente é capaz de chorar? - diziam uns mais agressivos. - Essas lágrimas são de ácido que vão corroer-lhe as carnes - dizia outro, impondo-se à vítima como a lhe hipnotizar, o que produzia em Pilatos a alteração da face, como se sulcos profundos fossem marcando a trilha por onde a gota cáustica escorresse. O governador estava, agora, entregue aos seus atos e à sementeira que fizera no passado, diante dos frutos amargos que o procuravam, como se lhe estivessem devolvendo o esforço da semeadura em uma carga exatamente correspondente à qualidade do que plantara. O seu estado emocional e mental beirava a alucinação, tentando fazer de tudo para sair dali, afastando-se dos quadros horrorosos que não se afastavam dele. Não adiantaram palavras de perdão, nem uma postura de arrependimento. Parecia, ao contrário, que quanto mais ele se mantinha humilde ou se humilhava diante daquela turba, mais sarcasmo e ironia ele escutava, por não acreditarem em suas novas disposições. Nenhum dos presentes estava disposto a deixar que, agora, ele se modificasse antes de acertarem as contas pelo muito que haviam sofrido em suas mãos impiedosas.Nada no mundo havia sido tão desesperador para sua alma do que aquela visão tétrica, onde se identificara a si próprio de maneira tão grotesca, sem entender como isso se estava passando. Diante de tal descoberta, as perseguições de suas vítimas eram suave veneno, preferível a qualquer ideia de se aproximar daquele local. No entanto, a sua conduta suicida o prendia ao túmulo e, por mais que desejasse se afastar, agora, como que se sentia imantado às sensações cadavéricas. Num esforço hercúleo, conseguiu levantar-se da cova como quem se liberta de uma trágica visão de um filme de terror. No entanto, seguia vinculado ao corpo físico por laços magnéticos que ele passara a ver e que, em vão, tentava romper com suas mãos. _ Tais cordões o mantinham em contato direto com as forças biológicas que destruíam suas vísceras e demonstravam ao seu antigo possuidor que não é possível despir-se de um corpo antes da hora sem ter que enfrentar as consequências do ato tresloucado e insano. Por mais que se afastasse agora do pedaço de terra que lhe servira de última morada, carregava consigo as sensações cruéis da decomposição. Sua fuga, no entanto, não o levava para lugares melhores. A turba dos desocupados e aproveitadores, espíritos sugadores de fluidos vitais, o buscava como se fossem vampiros à cata de sangue para se sentirem alimentados. Naturalmente, tal referência é apenas uma comparação inadequada, já que sabe, o leitor querido, que a figura vampiresca é fruto de um mito engenhoso com o qual se pretendeu escurecer um pouco mais a atmosfera terrena com uma mensagem de horror. No entanto, no plano espiritual, uma grande quantidade de entidades que perderam o corpo físico busca encontrar uma fonte de energia vital, em geral conseguida de corpos recém descartados, humanos ou de animais recém-abatidos, a fim de assimilarem forças biológicas que lhes produza a vã e temporária sensação de vitalidade corporal.  

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